terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Histórias de pescador

As pescarias clássicas são marcadas por algo mais que
peixes; tratam-se mais de retiros etílicos entre amigos, de buscas sempre incertas (os peixes são, talvez, o que menos conte), de canoas de prosa e cachaça ao ritmo das águas. Um pouco de silêncio para não espantar os peixes. Um pouco de esterco bovino fumegante para espantar os mosquitos. E o principal: histórias de pescador.

No telefonema que recebeu de Georg Bush no seu último dia de governo, Lula retribuiu o convite recebido do ex-presidente para visitá-lo no Texas, convidando-o para uma pescaria no Brasil. Fora o fato de que a própria retribuição ao convite se assemelhe a uma história de pescador e revele um tanto da nossa cordialidade, não deixa de ser cômico imaginar Lula e Bush molhando as minhocas nas águas quentes do Araguaia. Se Lula parece ter o estilo de quem pesca de anzol, segurando pacientemente a vara, buscando "negociações" com os peixes para que mordam o anzol, Bush tem o estilo de que gosta de pesca com tarrafa, sem qualquer paciência de espera ou de pescar peixe a peixe.


Mas, bem mais sério do que isso, a consideração dessas afinidades nem sempre publicamente perceptíveis entre governantes, mostra bem o erro daqueles que teimam em tomar os governados pelo governante.


Mas as pescarias talvez sejam uma boa metáfora para ler os governos e governantes. Mantendo o mote da transição de mandato presidencial nos EUA, as promessas de campanha de Barack Obama (como as de qualquer candidato), que hoje tomou posse como presidente, dentro em breve, provavelmente, não passarão de verdadeiras histórias de pescador. Aliás, desde a Revolução Francesa o mundo tem vivido uma verdadeira história de pescador, chamada capitalismo, cujo símbolo apropriado talvez fosse um peixe bem conhecido, a traíra.
OBS: na foto acima, o peixe denominado traíra.

4 comentários:

marginário disse...

Traíras, é preciso devorá-las. (Aliás, é um peixe suculento!)

floema disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
marginário disse...

posso garantir que a devoração não tem nenhum sentido "coital". apenas canibal, como diria Oswald de Andrade. (a pergunta: é possível devorar o capitalismo sem se por ele devorado? ). Sobre a "traíra", me reporto ao texto.

Marechá Panapaná disse...

A minha terra é mais inocente, cheia de caipiras/caiporas como eu, e "traíra" tem conotação mais gastro-etílica, o que me permite politizar simbolicamente, exatamente no sentido subterrâneamente indicado.
Não que isso seja da minha conta, mas eu fico pensando: depois do desconfiamento, viria o quê? Floema desconfiaria das raízes?